"Hoje, o INSS é o melhor investimento", afirma especialista



Essa afirmação foi feita por uma Planejadora Financeira para o site InfoMoney. A reportagem em que ela afirma isso você pode ler aqui. Segundo a reportagem:

"Para um profissional liberal ou autônomo, que possa contribuir com o teto (no INSS), essa é uma excelente estratégia. Hoje, o INSS é o melhor investimento para aposentadoria, caso o investidor saiba suas regras e como ganhar o máximo possível", aponta a especialista. "Quem pode contribuir com mais no INSS, essa nova regra é uma excelente oportunidade para ter uma boa renda estável no futuro. Para mulheres, então, a situação está melhor ainda", completa.

O objetivo do artigo é:

  • Mostrar ao leitor que a Previdência Social Pública é ineficiente e desvantajosa para o cidadão.







Erros de Premissas


No blog de sua consultoria, a Planejadora indica um artigo em que explica com números como chegou a conclusão de que o INSS é mais vantajoso. Caso queira ler, clique aqui.

Seu argumento é que se João, autônomo, com 40 anos e 5 de contribuição para o INSS, pagar R$ 515,92 por ano (correspondendo a 20% do salário de R$ 2.500,00 mais R$ 15,92 de Imposto de Renda -- adendo: não sei de onde tirou esses valor do IR), por mais 25 anos terá garantido uma aposentadoria integral de R$ 2.500,00.

Seus cálculos, segundo o artigo, foram baseados na regra anterior do INSS, portanto, sem considerar a regra 85/95, recentemente aprovada.

Ora, qualquer pessoa que tenha tido algum contato mínimo com as regras da aposentadoria, seja porque estivesse perto de obter o benefício ou porque acompanhou a saga de alguém próximo, intuitivamente, sem precisar de demonstração matemática, perceberia que há algo errado na argumentação da Planejadora. Vamos aos números e fatos.

Primeiro, nos deparamos com uma impossibilidade. O sujeito é homem. Pela regra anterior, o tempo mínimo de contribuição dos homens para aposentadoria integral seria de 35 anos. 30 anos seria o tempo mínimo para requerer aposentadoria PROPORCIONAL. Portanto, nada de R$ 2.500,00 de benefício.

Mas vamos deixar passar isso e continuar a análise.

Segundo, o valor que a Previdência Social considera como base para iniciar o cálculo do benefício não é o último salário de contribuição, mas os 80% maiores salários. Mas, a Planejadora considerou um cenário de salário constante e sem inflação. Para um salário constante devemos também entender que o João não foi agraciado com promoções que elevassem seu salário ao longo do período laboral. Que pena pro João.

Terceiro, a Planejadora esquece (espero que não de propósito) de considerar o efeito do Fator Previdenciário no cálculo da aposentadoria. Para o exemplo dado, deixando de lado mais uma vez a questão da aposentadoria proporcional, deveria ser aplicado o fator 0,922 considerando que o requerente teria 30 anos de contribuição e 65 anos de idade. Veja a tabela abaixo extraída do site da Previdência Social:


Dessa forma, o valor de R$ 2.500,00 seria multiplicado por 0,922, o que daria um benefício de R$ 2.305. Ainda assim vantajoso em relação aos R$ 1.369,49 calculados pela Planejadora que seria equivalente a uma aposentadoria pelo Salário Mínimo e renda obtida pela aplicação da diferença de contribuição ao INSS entre o Salário Mínimo e os R$ 2.500,00.

Não perderei tempo refazendo os cálculos para saber se o valor a que chegou está correto. Farei uma abordagem diferente, ignorando todos os erros utilizados nas premissas da Planejadora e me fixando na resposta a seguinte pergunta:


É mais vantajoso investir R$ 515,92 por mês na Previdência Social ou em outro investimento?


Vamos considerar as mesmas premissas utilizadas pela Planejadora:

  • Tempo de Investimento: 30 anos
  • Taxa Real de Rentabilidade: 2% ao ano

Frisamos, também, que a taxa apresentada é considerada real, ou seja, líquida da inflação. Essa premissa é importante porque o objetivo final é a garantia do poder de compra. Convertendo a taxa de rentabilidade de anual para mensal temos uma rentabilidade de 0,17% ao mês. Capitalizando o investimento de R$ 515,92 ao longo de 30 anos temos:


O que vemos no gráfico é que, ao longo de 30 anos, teríamos investido R$ 185,7 mil para acumularmos um montante de R$ 253,5 mil. Um lucro de R$ 67,7 mil ou 36,5%.

Segundo a Planejadora, o que foi pago à Previdência Social garantiria uma aposentadoria de R$ 2.500,00.

E quanto o montante acumulado garantiria de aposentadoria? Basta multiplicar R$ 253,5 mil pela taxa mensal de 0,17% que dá um total de R$ 418,60. Só isso!


Então está certa a Planejadora! (Só que não!)


A premissa da Previdência é que o beneficiário somente receberá seu benefício por um determinado período que é dado pela Expectativa de Vida. Hoje, por exemplo, segundo os últimos dados do IBGE, a expectativa de vida do brasileiro é de 75 anos. Portanto, João teria que consumir o montante acumulado em 10 anos.

Qual seria o valor que João poderia sacar a cada mês para que o total acumulado durasse esses 10 anos? R$ 2.330,05.

Ora, veja só, menor que os R$ 2.500,00 calculados (equivocadamente) pela Planejadora, porém muito próximo do valor aplicando-se o Fator Previdenciário.

Mas, espere, não é só isso! Veja a tabela abaixo com os Títulos Públicos disponíveis para compra:


Em amarelo, destaquei o Título Público que, no meu entendimento, seria o mais adequado para o plano de aposentadoria de João. Veja que a taxa REAL é 3 vezes superior a utilizada pela analista. Vamos, agora, olhar o gráfico anterior novamente. Só que, dessa vez, a capitalização do investimento será com a taxa anual de 6,11%:


O saldo acumulado agora é de R$ 512,9 mil, para o mesmo capital. Uma lucratividade de 176%. E agora, com essa taxa, qual seria a renda possível de ser obtida? R$ 2.540,90.

Se considerarmos o período de 10 anos, a renda obtida por João seria igual a R$ 5.679,71. Muito maior que a obtida com a Previdência Social.

Mas, obviamente, não é recomendado que o valor seja consumido nestes 10 anos. Até porque o João pode ter uma longevidade maior, já que a expectativa de 75 é uma média da população e possui seus desvios estatísticos. A recomendação é que seja sacado apenas o ganho real que são os R$ 2.540,90.


Há, ainda outro motivo para João não aderir a Previdência Social.


Quando o segurado da Previdência Social falece, o dependente tem direito a pensão vitalícia no valor correspondente a metade do benefício. Ou seja, no exemplo da consultora, R$ 1.250,00. A premissa é que metade seria suficiente para manter uma pessoa (como se os custos fixos também reduzissem na mesma proporção).

Já ao fazer seu próprio fundo previdenciário, o cidadão, ao falecer, deixará o montante acumulado para seus herdeiros. Isso significa dizer que, no mínimo, considerando uma redução de 20% para pagamento de tributos e despesas decorrentes do inventário, a renda que ficará para os herdeiros seria de R$ 2.032,73, maior que a obtida com a Previdência Social.


Conclusão


Não esgotamos todas as possibilidades de análises a respeito da Previdência Social. Aqui não tratamos nem dos ricos embutidos numa Previdência Social deficitária.

Além disso, por se tratar de um objetivo de investimento de Longo Prazo (30, 40 ou 50 anos), assir posições mais arriscadas podem promover uma rentabilidade ainda melhor que a do nosso último exemplo.

A lição que fica é que nós devemos ser os timoneiros dos nossos investimentos. Transferir essa responsabilidade a terceiros, especialmente um ente público, é sinal certo de insucesso financeiro!


Pense nisso!

Um grande abraço e até a próxima!


Kleber Rebouças

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